Com a finalidade de contribuir para reduzir a incidência das Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (IRAS) em serviços de saúde e prevenir danos aos usuários dos serviços de saúde e prejuízos associados aos cuidados decorrentes de processos, foi feita esta publicação pela ANVISA. O intuito é apresentar de maneira objetiva, as medidas para a prevenção e controle de infecção nos serviços de saúde e contribuir para reduzir a incidência das IRAS. Dessa forma, espera-se com esta publicação, oferecer um importante instrumento de apoio para a prevenção e redução das principais IRAS, como as Infecções do Trato Respiratório, Trato Urinário, Corrente Sanguínea e Sítio Cirúrgico, contribuindo para a redução de riscos nos serviços de saúde do Brasil.

Medidas de Prevenção de Infecção da Corrente Sanguínea.  
Introdução

As infecções da corrente sanguínea (ICS) relacionadas a cateteres centrais (ICSRC) estão associadas a importantes desfechos desfavoráveis em saúde. No Brasil o estudo Brazilian SCOPE (Surveillance and Control of Pathogens of Epidemiological Importance) encontrou 40% de taxa de mortalidade entre pacientes com ICS. Dados nacionais publicados pela ANVISA que monitora perfis de suscetibilidade de isolados microbianos evidenciam que cerca de 40% dos isolados de Klebsiella spp e 80% dos isolados de Acinetobacter spp sejam resistentes aos carbapenêmicos. No Brasil, ainda há poucos estudos que avaliem o impacto econômico destas infecções. No entanto, dados preliminares sugerem que ele varie entre 7.906 dólares americanos a 100.000 reais por episódio.

Fisiopatogenia

Fonte: Maki DG. Infections due to infusion therapy, 1992 e 2004.

Composição dos cateteres

O material utilizado na fabricação dos cateteres e seus componentes influenciam diretamente na ocorrência de complicações. Os cateteres deverão ser radiopacos. Cateteres utilizados para a punção venosa são considerados produtos para a saúde de reprocessamento proibido (Resolução de Diretoria Colegiada – RDC nº 156, de 11 de agosto de 2006 e Resolução Específica – RE nº 2.605, de 11 de agosto de 2006); por esta razão, em casos de insucesso no procedimento, os mesmos não podem ser usados para uma nova tentativa de punção. Os cateteres flexíveis, como o de poliuretano, estão associados a menores complicações infecciosas do que cateteres confeccionados com cloreto de polivinil ou polietileno e ainda contribuem significativamente para a redução de flebites em punções venosas periféricas.

Medidas de prevenção

 

1. Recomendações para cateteres periféricos

– Higienizar as mãos antes e após a inserção de cateteres e para qualquer tipo de manipulação dos dispositivos

– Selecionar o cateter periférico com base no objetivo pretendido, na duração da terapia, na viscosidade do fluido, nos componentes do fluido e nas condições de acesso venoso

– Evitar região de flexão, membros comprometidos por lesões como feridas abertas, infecções nas extremidades, veias já comprometidas  – Em caso de sujidade visível no local da futura punção, removê-la com água e sabão antes da aplicação do antisséptico

– Estabilizar o cateter significa preservar a integridade do acesso, prevenir o deslocamento do dispositivo e sua perda.

– Qualquer cobertura para cateter periférico deve ser estéril, podendo ser semioclusiva (gaze e fita adesiva estéril) ou membrana transparente semipermeável – Realizar o flushing e aspiração para verificar o retorno de sangue antes de cada infusão para garantir o funcionamento do cateter e prevenir complicações

– Avaliar o sítio de inserção do cateter periférico e áreas adjacentes quanto à presença de rubor, edema e drenagem de secreções por inspeção visual e palpação sobre o curativo intacto e valorizar as queixas do paciente em relação a qualquer sinal de desconforto, como dor e parestesia.  – Remover o cateter periférico na suspeita de contaminação, complicações ou mau funcionamento.

2. Recomendações para cateter central de curta permanência

– Pacientes sem reais condições de acesso venoso por venóclise periférica

– Necessidade de monitorização hemodinâmica

– Acesso imediato para terapia dialítica

3.  Medidas educativas

Os profissionais de saúde envolvidos na inserção, devem ser educados quanto ao cuidado e manutenção de cateteres vasculares sobre a prevenção de IPCS. Durante a inserção é necessário utilizar um checklist de inserção de cateter central para assegurar as práticas de prevenção de IPCS no momento da inserção do cateter.

4. Uso de lock na prevenção de ICSRC para dispositivos de longa permanência 

1. O uso de lock com substâncias contendo propriedades antimicrobianas em substituição a outros produtos desprovidos desta ação (heparina e soro fisiológico 0,9%) para cateteres de longa permanência (PICC, cateteres semi-implantáveis e totalmente implantáveis) que possam permanecer fechados é recomendado na população adulta e pediátrica submetida à hemodiálise, quimioterapia e a uso de nutrição parenteral 

– A aplicação de uma solução contendo produtos com propriedades antimicrobianas (antibióticos, antifúngicos ou outros antissépticos) nos dispositivos de longa permanência enquanto os mesmos não estiverem em uso, desde que por um período suficientemente prolongado, pode prevenir a formação de biofilmes e eliminar os já presentes no dispositivo evitando o desenvolvimento de ICSRC. Esta estratégia, conhecida como lock (selamento), foi amplamente avaliada em diversos ECR e metanálises que envolveram principalmente pacientes em diálise, tratamento para câncer e nutrição parenteral prolongada.

– O receio de se recomendar o uso de lock de forma mais sistemática se devia principalmente ao risco de desenvolvimento de resistência, relacionado à utilização de produto antibiótico (p.ex, gentamicina). Em artigo que avaliou o uso de lock com gentamicina por períodos prolongados, demonstrou-se perda progressiva da ação do fármaco com piora no desfecho dos pacientes relacionada ao desenvolvimento de resistência

2. A escolha por um produto com propriedades antimicrobianas que não pertença à classe de antibióticos/antifúngicos (etanol ou taurolidina) como agente preferencial para lock é recomendada

– O etanol já foi avaliado como agente para lock em diversos estudos e em pelo menos uma revisão sistemática com metanálise. Embora seu uso tenha ocorrido sem maiores problemas mesmo em situações de flushing inadvertido, este produto pode se associar a alguns efeitos adversos, como tonturas e confusão mental, além de elevação de provas de função hepática. Outra questão importante que poderia limitar o uso de etanol como agente de eleição é seu efeito sobre a composição dos cateteres. Demonstrou-se perda de partículas de silicone e alteração na resistência e na elasticidade do poliuretano, duas das mais frequentes matérias presentes nos cateteres intravenosos.

– A taurolidina é um derivado de taurinamida que exerce ação antibacteriana e antifúngica através de vários mecanismos distintos. Sua ação assemelha-se mais a de um antisséptico do que a de um antibiótico/antifúngico. Ao menos duas metanálises recentes compararam lock contendo taurolidina (com citrato, heparina ou ambos) com heparina em populações adultas e pediátricas com dispositivos de longa permanência inseridos/ implantados por diversas indicações (hemodiálise, tratamento de câncer e nutrição parenteral prolongada). No geral, o uso de taurolidina reduziu o risco de ICSRC em quase 70% e foi extremamente bem tolerado. Curiosamente, a despeito da ação ser de amplo espectro, o produto parece ser particularmente ativo contra bactérias Gram-negativas, que predominam com agentes causais das IPCS em nosso meio. Uma propriedade importante é que eventuais falhas não parecem estar associadas a desenvolvimento de resistência. Em uma análise de 14 casos de ICSRC que ocorreram a despeito do uso de taurolidina, as concentrações inibitórias mínimas (MIC) encontradas não se apresentavam acima das MIC de cepas não expostas previamente ao composto. Esta aparente “resiliência” à resiste ̂ncia e ́ uma propriedade fundamental para um produto cujo objetivo é a utilização por longos períodos. O uso de taurolidina como agente preferencial ao etanol pode ser considerado, devido ao menor potencial de toxicidade. Não existem evidências para se definir tempo mínimo de lock que deva ser mantido nas vias do cateter para garantir eficácia da estratégia (assunto não resolvido).

CLIQUE AQUI e Confira o link original do estudo no próprio site da ANVISA.